quarta-feira, 11 de maio de 2011

Sobre pais, filhos, drogas e trotes

Não dá para os pais se culparem sempre que o filho desgarra do caminho, mas podem dialogar e mostrar que existem riscos.
Quando vi na semana passada a foto de uma mãe abraçando o filho preso por tráfico de drogas na Polícia Federal do Rio e, logo depois, desmaiando no pátio, pensei na dor e na culpa maternas. Quando vi o drama de um calouro de veterinária, de 21 anos, no interior de São Paulo, chicoteado por colegas e obrigado a rolar no chão com bichos em decomposição, pensei no pai dele. E nos pais dos universitários que se comportaram como animais. Pensei nos meus filhos. Pensei em nossos compromissos como mães e pais.
Criar e educar filhos nunca foi fácil. Em ambientes violentos, o desafio é muito mais duro. Ali, nas sutilezas do dia a dia. Não existem receitas. O que funciona para um filho não funciona para outro. Mas o que não pode faltar jamais é o diálogo, a conversa, o papo. Sincero na medida do possível, na medida do respeito, porque pais não são colegas de turma de seus filhos. Não sou educadora, certamente cometi erros como mãe e tive muitas dúvidas. Minha maior preocupação não era se meus filhos iriam experimentar e gostar de maconha. Conversei bastante com eles sobre drogas. Eu desejava sobretudo é que tivessem um bom caráter. Que fossem honestos. Que nunca se comportassem como playboys acima do bem e do mal. Quando vejo as gangues de mauricinhos traficantes de drogas e armas, e os trotes animalescos nas universidades, eu penso nos pais, nas famílias, nas escolas que frequentaram. O que pode ter dado errado?
A psiquiatra Magda Vaissman é pesquisadora do Programa de Ensino e Assistência ao Uso Indevido de Álcool e Drogas, da UFRJ. “Não conheço a família dos rapazes presos, mas certas famílias não conseguem enxergar evidências claras. São chamadas famílias disfuncionais, onde ninguém fala, ouve ou vê nada dentro de casa. Certa vez, atendi o filho de 6 anos de uma socialite, uma criança com vários problemas de convivência. Descobri que o pai era agressivo quando ele fazia besteira e a mãe evitava lidar diretamente com o filho. Os pais então contratavam profissionais para tentar ‘consertá-lo’, inclusive psiquiatras. Essa criação acaba formando adultos sociopatas”, diz.
Criar e educar filhos nunca foi fácil. O papel dos pais é dialogar,
dar limites e mostrar que existem riscos.
O papel dos pais, diz Magda, é o de dialogar e estabelecer limites. “Ensinar ao filho, desde cedo, que existem desafios, que tudo de bom precisa de um processo até ser alcançado. Os pais precisam abrir o jogo com os filhos em relação às drogas. Fumar maconha ou beber não levam necessariamente ao vício, mas esse risco existe.”
Não dá para os pais se culparem sempre que o filho desgarra do caminho. Mas qualquer adulto inteligente e instruído tem perfeita consciência de seu desempenho como pai ou mãe. Fiz o possível? Fiquei atento? Estive muito ausente? Fui condescendente demais para compensar minhas ausências? Fui repressor demais para aliviar meus traumas?
A delegada Patrícia Aguiar, da Delegacia de Combate às Drogas (DCOD), em novembro de 2007, quando foram presos nove jovens de classe média envolvidos com tráfico de ecstasy e LSD, chamou a atenção para o comportamento dos pais: “Como eles não percebem que há algo errado com um filho que tem três celulares e fica 16 mil horas ao telefone? Sem falar nos bens de consumo que são levados para casa. Não pensam de onde sai esse dinheiro? Fiquem mais atentos”.
Nossa sociedade também não ajuda. Extremamente hierarquizada, benevolente com os mais ricos, submissa com os poderosos, tolerante com a falta de educação dos endinheirados, e inacreditavelmente omissa diante dos escândalos de corrupção e abusos de poder.
O que acontecerá com os universitários que torturaram o calouro Bruno Ferreira, em Leme, a 189 quilômetros da capital paulista? “Meu filho foi amarrado a um poste e apanhou com chicote. Quem conhece sabe como é a marca de chibata. No hospital, deu entrada como indigente, em coma alcoólico. Foi obrigado a ingerir bebidas. Teve de rolar numa lona com excremento de porco, cavalo e gado. O mau cheiro ainda não saiu do corpo dele”, disse o pai de Bruno, o comerciante Paulo Ferreira.
Qual foi, qual será o castigo para esses universitários? Dentro e fora de casa? O que diremos a nossos filhos?